sexta-feira, 9 de outubro de 2015

A Mulher da Mata Escura

Ela era apenas a lenda de uma mulher que sempre viveu sozinha, com o filho pequeno, em uma casa de madeira no meio da mata. Diz a lenda, que louca pelo silêncio do vento na mata, ela matou o filho de 7 anos de idade e depois se matou.

Ninguém nunca soube de verdade o que aconteceu, pois o acesso era difícil e o único caminho pra chegar até lá era uma velha estrada de chão, estreita e esburacada, em um antigo caminho de mineradores que trabalharam naquela região entre 1911 e 1950.

Com o passar do tempo, depois que a mina de carvão foi desativada, aquele trajeto foi esquecido por todos da cidade. Apenas alguns pescadores passavam por lá para ir em um trecho do rio da Pedras, que diziam ser um ótimo ponto de pesca.

A primeira vez que falaram sobre uma mulher que andava por aquela região foi nos idos de 1960, quando um homem disse ter avistado uma mulher coberta por uma renda preta, caminhando vagarosamente entre as árvores secas.

Depois, em 1964, um pescador, junto com seu filho adolescente, juram ter visto o vulto de uma pessoa, provavelmente uma mulher, coberta com um tecido preto transparente, na margem oposta de onde eles pescavam. Eles afirmam que ela olhava diretamente pra eles, mas que não havia nada em seus olhos, apenas um globo branco e sem brilho.

Em 1970 ocorre o primeiro desaparecimento na mata.

Dois casais de jovens mentem para suas famílias e vão acampar na mata e não são mais vistos. São dados como desaparecido e apenas um deles, Mika – 19 anos, retorna 33 dias depois. Em seus depoimentos para a polícia local suas informações são desconexas e não fazem sentido. Ele fala de risos de uma mulher durante a madrugada, de um vulto que caminhava arrastando um ancinho e de terem ficado todo este tempo atados em uma árvore. Que durante a escuridão da noite, algo mordia a barriga deles e comia suas entranhas sem que os outros vissem o que os atacava.

O jovem nunca conseguiu comprovar nada do que dizia e nem como tinha sido o único a escapar. Como os outros jovens não foram encontrados, Mika é condenado a passar o resto da sua vida em um sanatório mental.

Seis meninos de um grupo de escoteiros some em 1977. Seus restos mortais são encontrados um ano depois. Em seus ossos são identificadas várias mordidas de animais e uma mordida que não combina com nenhum animal da região.

Um dos policiais que investigou o desaparecimento dos meninos, relata que em uma das buscas avistou, distante cerca de 100m, o que parecia ser uma mulher completamente nua e com cabelos longos que iam até o chão. Segundo o policial, quando ele fez menção de ir em direção à mulher, a mesma saiu correndo como um animal, curvada, com as mãos e com os pés.

Nunca acreditaram no que o policial falava.

Desde 1980 ninguém mais tem coragem de entrar naquela região da mata.

Mas muitas pessoas comentam sobre o vulto de uma mulher que anda acompanhada de uma criança que não teria os olhos e com a boca costurada com pequenos anzóis.


Texto, criação, arte e pós: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Danielly Cerezer Benetti

domingo, 6 de setembro de 2015

Demônios Intestinos

Um ser a consome todos os dias. Ela sabe disto, ela sente isto. Não é uma sensação existencial, muito pelo contrário... ela sente os pequenos dentes do ser interior devorando a sua carne.

Mas ninguém acredita no que ela fala. Todos acham que ela é uma insana, uma jovem mimada que quer chamar atenção para seus problemas emocionais.

Tentou avisar seus pais quando criança, dizendo que sentia algo dentro dela, como uma pequena enguia gosmenta que percorria suas entranhas.

Falou com seus namorados quando adolescente, explicando que algo se alimentava dentro de seus órgãos internos.

Nada adiantou.

Hoje ela conta para seu marido, e mesmo assim ele não presta atenção no que ela fala.

Então ela não se importa mais... quer que o ser que a consome, assuma o seu corpo e mate todas as pessoas que duvidaram da sua palavra.

E isto aconteceu durante a última madrugada.

Ela acordou no meio da noite com fome. As suas unhas estavam pontiagudas como as garras de um animal, seus dentes pareciam agulhas. Ela sentia sob a pela milhares de vermes se arrastarem.

Ela era o casulo de todos eles. Era a mãe de todos eles. E ela precisava alimentá-los.

O cheiro que a pele do seu marido exalava deixava ela cada vez mais faminta. Seu ataque foi tão rápido que ele nem conseguiu reagir, ela mergulhou os dentes no pescoço dele e arrancou um pedaço.

Como um animal, pulou sobre a barriga dele e rasgou-a com mordidas enlouquecidas. De sua boca, um tubo parecido com um grande cordão umbilical apodrecido sugava as vísceras totalmente, até o corpo de ele ter virado uma casca de carne vazia.

Encontraram os restos mortais do marido dela uma semana depois, quando a polícia arrombou a casa após os vizinhos terem telefonado avisando do mau cheiro e de que não avistavam os donos há dias.

E nenhum sinal dela.

Texto, criação, arte e pós: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Jessica Ulmann

sábado, 5 de setembro de 2015

Sombras

Quem passava pelo antigo casarão dizia que ele era abandonado. Mas muitos relatos comentavam sobre os gritos que eram ouvidos lá de dentro, emitidos por uma jovem mulher de pele alva que chorava à noite.

Ninguém sabia quem era ela, mas todos a chamavam de “Irmã da Misericórdia”.

A verdade é que ela era apenas uma sombra vagando em uma casa vazia.

Uma jovem que amou o próprio irmão e se entregou à paixão incestuosa.

Eles eram gêmeos. E desde cedo ela tinha ciúmes dele, não admitia que tivesse outras mulheres, não admitia ver ele conversando com qualquer outra que não fosse ela.

Ao completarem 17 anos, ele levou uma amiga para a festa de aniversário deles e apresentou-a para a família como a sua namorada. Ela não aguentou ver aquilo e naquele momento, enquanto todos riam e bebiam, resolveu tomá-lo para si. Nenhuma mulher o amaria como ela o amava.

Depois de todos irem embora, ela convidou o irmão, já meio alcoolizado, para ir para seu quarto continuar bebendo e escutando música. Eles sentaram na cama e falavam animadamente, bebiam muito e brincavam. Foram até altas horas da madrugada, quando ele, completamente embriagado e sem conseguir raciocinar mais, “apagou” e deitou na cama.

Prontamente ela levantou, trancou a porta do quarto e se deitou ao lado do irmão. Se despiu e lentamente tirou a roupa dele. Ao ver o corpo dele nu tocando o dela, ficou mais extasiada ainda. Sua boca percorria o corpo dele, sugava-o com a fome de um amor proibido. Ela o masturbou e se masturbou juntamente.

Excitada por senti-lo inteiro em sua mão, gozou e dormiu.

Acordou com o grito do irmão. Levantou de uma vez só da cama e o viu em pé, estático no meio do quarto. Ao dar o primeiro passo na direção dele, pisou em algo molhado no chão. Ela olhou e viu a poça vermelha. Levantou a cabeça lentamente, seguindo o rastro de sangue que começava nos pés dele. Subiu o olhar com medo, vendo que o vermelho quente escorria pelo branco frio da pele do irmão.

Olhou para o rosto dele e viu que não tinha nenhuma expressão, não emitia nenhum som, nenhuma lágrima. Ela baixou o olhar pois algo na mão dele chamou a sua atenção. Ali estava, pingando sangue como um pedaço de carne podre, o pênis. Ele o arrancara com as próprias mãos, como que tentando tirar uma doença cancerígena de dentro do corpo.

Ele cai no chão pesadamente, ela se desespera, e também nua se atira ao seu encontro. Fica abraçada de forma desesperada vendo os últimos suspiros do irmão.

Ela não suporta saber que o amor dela se foi, não suporta ver aquilo. Rapidamente levanta, toda suja de sangue, e pega em sua penteadeira o canivete butterfly que havia dado para o irmão de presente na noite anterior.
Ela não suportaria viver com o que fez, não suportaria ver o corpo do irmão se deteriorando, sendo devorado por vermes. Com dois movimentos rápidos, ela abre o canivete e enfia em seus olhos com violência.

Grita de dor, mas não simplesmente por furar o globo ocular, mas sim por perder o amor da sua vida.

Na manhã seguinte os pais arrombaram a porta do quarto e encontraram os irmãos mutilados, a mão dela sobre o peito do irmão, como se estivesse fazendo um carinho.

Hoje ela é assombrada pelo silêncio, condenada a vagar eternamente em uma casa vazia.

Seus olhos não conheciam mais a luz, então ela anda pelas sombras do esquecimento, buscando a paz que jamais encontrará.

Texto, criação, arte e pós: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Jessica Ulmann

domingo, 23 de agosto de 2015

Vazio

Presa em um quarto escuro.

Assim ela estava.

Não sabia desde quando estava ali, alguns dias chegava até mesmo a pensar que tinha nascido ali dentro.

Não lembrava mais como era o sol ou se ele realmente existia, não lembrava mais as cores e muito menos como eram chamadas. Vermelho e amarelo pra ela nada significavam.

Seu único contato com o mundo era o prato de comida que era deixado pra ela. Todo dia uma portinhola era aberta e uma mão empurrava um prato de metal com a comida.
Isso era tudo o que ela via. Tudo o que sabia do mundo exterior é que alguém vivia do outro lado da porta.

Mas quem era esta pessoa?

Por que trazia comida para ela todo dia?

E o mais importante de tudo... por que não deixava ela sair dali?

Um dia a portinhola abriu para entregar o prato de comida e não fechou novamente. Pela abertura ela podia ver que a pessoa estava ali do lado de fora parada.

Engatinhou até ali e se abaixou para poder espiar para fora. Viu os pés parados e tentou tocá-los. Não sabia como, mas podia sentir que estavam olhando para baixo... olhando para a mão dela tocando o sapato preto e bem polido.

A pessoa se abaixou e tocou a mão dela. Pela primeira vez na vida sentiu o calor de outro corpo. O toque era delicado, suave como um carinho paterno.

Lentamente empurraram a mão dela para dentro do quarto escuro.

Ela ouvia algo baixo, um lamurio, um choro talvez. Então escutou algo... “me desculpe”. E viu a portinhola se fechar.

Naquele momento ela soube.

Era a última vez que ela receberia o prato diário de comida.

Era a última vez que a portinhola se abriu.

Agora... só lhe restava o escuro e o vazio até o fim.


Texto e arte: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Danielly Cerezer Benetti