domingo, 6 de setembro de 2015

Demônios Intestinos

Um ser a consome todos os dias. Ela sabe disto, ela sente isto. Não é uma sensação existencial, muito pelo contrário... ela sente os pequenos dentes do ser interior devorando a sua carne.

Mas ninguém acredita no que ela fala. Todos acham que ela é uma insana, uma jovem mimada que quer chamar atenção para seus problemas emocionais.

Tentou avisar seus pais quando criança, dizendo que sentia algo dentro dela, como uma pequena enguia gosmenta que percorria suas entranhas.

Falou com seus namorados quando adolescente, explicando que algo se alimentava dentro de seus órgãos internos.

Nada adiantou.

Hoje ela conta para seu marido, e mesmo assim ele não presta atenção no que ela fala.

Então ela não se importa mais... quer que o ser que a consome, assuma o seu corpo e mate todas as pessoas que duvidaram da sua palavra.

E isto aconteceu durante a última madrugada.

Ela acordou no meio da noite com fome. As suas unhas estavam pontiagudas como as garras de um animal, seus dentes pareciam agulhas. Ela sentia sob a pela milhares de vermes se arrastarem.

Ela era o casulo de todos eles. Era a mãe de todos eles. E ela precisava alimentá-los.

O cheiro que a pele do seu marido exalava deixava ela cada vez mais faminta. Seu ataque foi tão rápido que ele nem conseguiu reagir, ela mergulhou os dentes no pescoço dele e arrancou um pedaço.

Como um animal, pulou sobre a barriga dele e rasgou-a com mordidas enlouquecidas. De sua boca, um tubo parecido com um grande cordão umbilical apodrecido sugava as vísceras totalmente, até o corpo de ele ter virado uma casca de carne vazia.

Encontraram os restos mortais do marido dela uma semana depois, quando a polícia arrombou a casa após os vizinhos terem telefonado avisando do mau cheiro e de que não avistavam os donos há dias.

E nenhum sinal dela.

Texto, criação, arte e pós: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Jessica Ulmann

sábado, 5 de setembro de 2015

Sombras

Quem passava pelo antigo casarão dizia que ele era abandonado. Mas muitos relatos comentavam sobre os gritos que eram ouvidos lá de dentro, emitidos por uma jovem mulher de pele alva que chorava à noite.

Ninguém sabia quem era ela, mas todos a chamavam de “Irmã da Misericórdia”.

A verdade é que ela era apenas uma sombra vagando em uma casa vazia.

Uma jovem que amou o próprio irmão e se entregou à paixão incestuosa.

Eles eram gêmeos. E desde cedo ela tinha ciúmes dele, não admitia que tivesse outras mulheres, não admitia ver ele conversando com qualquer outra que não fosse ela.

Ao completarem 17 anos, ele levou uma amiga para a festa de aniversário deles e apresentou-a para a família como a sua namorada. Ela não aguentou ver aquilo e naquele momento, enquanto todos riam e bebiam, resolveu tomá-lo para si. Nenhuma mulher o amaria como ela o amava.

Depois de todos irem embora, ela convidou o irmão, já meio alcoolizado, para ir para seu quarto continuar bebendo e escutando música. Eles sentaram na cama e falavam animadamente, bebiam muito e brincavam. Foram até altas horas da madrugada, quando ele, completamente embriagado e sem conseguir raciocinar mais, “apagou” e deitou na cama.

Prontamente ela levantou, trancou a porta do quarto e se deitou ao lado do irmão. Se despiu e lentamente tirou a roupa dele. Ao ver o corpo dele nu tocando o dela, ficou mais extasiada ainda. Sua boca percorria o corpo dele, sugava-o com a fome de um amor proibido. Ela o masturbou e se masturbou juntamente.

Excitada por senti-lo inteiro em sua mão, gozou e dormiu.

Acordou com o grito do irmão. Levantou de uma vez só da cama e o viu em pé, estático no meio do quarto. Ao dar o primeiro passo na direção dele, pisou em algo molhado no chão. Ela olhou e viu a poça vermelha. Levantou a cabeça lentamente, seguindo o rastro de sangue que começava nos pés dele. Subiu o olhar com medo, vendo que o vermelho quente escorria pelo branco frio da pele do irmão.

Olhou para o rosto dele e viu que não tinha nenhuma expressão, não emitia nenhum som, nenhuma lágrima. Ela baixou o olhar pois algo na mão dele chamou a sua atenção. Ali estava, pingando sangue como um pedaço de carne podre, o pênis. Ele o arrancara com as próprias mãos, como que tentando tirar uma doença cancerígena de dentro do corpo.

Ele cai no chão pesadamente, ela se desespera, e também nua se atira ao seu encontro. Fica abraçada de forma desesperada vendo os últimos suspiros do irmão.

Ela não suporta saber que o amor dela se foi, não suporta ver aquilo. Rapidamente levanta, toda suja de sangue, e pega em sua penteadeira o canivete butterfly que havia dado para o irmão de presente na noite anterior.
Ela não suportaria viver com o que fez, não suportaria ver o corpo do irmão se deteriorando, sendo devorado por vermes. Com dois movimentos rápidos, ela abre o canivete e enfia em seus olhos com violência.

Grita de dor, mas não simplesmente por furar o globo ocular, mas sim por perder o amor da sua vida.

Na manhã seguinte os pais arrombaram a porta do quarto e encontraram os irmãos mutilados, a mão dela sobre o peito do irmão, como se estivesse fazendo um carinho.

Hoje ela é assombrada pelo silêncio, condenada a vagar eternamente em uma casa vazia.

Seus olhos não conheciam mais a luz, então ela anda pelas sombras do esquecimento, buscando a paz que jamais encontrará.

Texto, criação, arte e pós: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Jessica Ulmann