domingo, 23 de agosto de 2015

Vazio

Presa em um quarto escuro.

Assim ela estava.

Não sabia desde quando estava ali, alguns dias chegava até mesmo a pensar que tinha nascido ali dentro.

Não lembrava mais como era o sol ou se ele realmente existia, não lembrava mais as cores e muito menos como eram chamadas. Vermelho e amarelo pra ela nada significavam.

Seu único contato com o mundo era o prato de comida que era deixado pra ela. Todo dia uma portinhola era aberta e uma mão empurrava um prato de metal com a comida.
Isso era tudo o que ela via. Tudo o que sabia do mundo exterior é que alguém vivia do outro lado da porta.

Mas quem era esta pessoa?

Por que trazia comida para ela todo dia?

E o mais importante de tudo... por que não deixava ela sair dali?

Um dia a portinhola abriu para entregar o prato de comida e não fechou novamente. Pela abertura ela podia ver que a pessoa estava ali do lado de fora parada.

Engatinhou até ali e se abaixou para poder espiar para fora. Viu os pés parados e tentou tocá-los. Não sabia como, mas podia sentir que estavam olhando para baixo... olhando para a mão dela tocando o sapato preto e bem polido.

A pessoa se abaixou e tocou a mão dela. Pela primeira vez na vida sentiu o calor de outro corpo. O toque era delicado, suave como um carinho paterno.

Lentamente empurraram a mão dela para dentro do quarto escuro.

Ela ouvia algo baixo, um lamurio, um choro talvez. Então escutou algo... “me desculpe”. E viu a portinhola se fechar.

Naquele momento ela soube.

Era a última vez que ela receberia o prato diário de comida.

Era a última vez que a portinhola se abriu.

Agora... só lhe restava o escuro e o vazio até o fim.


Texto e arte: Nixon Vermelho
Foto: Jeferson Vilanova Reis
Modelo: Danielly Cerezer Benetti